sexta-feira, 16 de julho de 2010

Uma Primavera inesquecível em Genebra 1



Corríamos feito loucos pelas calçadas geladas da Rue Mont Blanc.

- Se perdermos o trem não temos mais como ir pra casa! – gritou Cínthia à minha frente.

Passei dela e lhe estendi a mão.

- Venha!

O pavimento estava úmido e perigoso. Genebra estava fria e a fumaça branca saía de nossas bocas pelo esforço da corrida. Era começo de primavera, mas o frio ainda imperava.

Entramos na Gare Cornavin esbaforidos. O trem para Nyon saía às vinte e três e dois. Aquele “dois” me fazia crer que a pontualidade Suíça, famosa por seus relógios, era levada muito a sério. Cínthia consultou a hora e percebeu que havia se enganado, ainda eram dez e meia da noite. Tínhamos 32 minutos antes de o trem partir.

- Vamos tomar um café no restaurante da Gare? – sugeriu ela.

Parecia uma boa pedida, pensei. Naquele frio nada melhor que algo quente para aquecer por dentro. Entramos no restaurante. Era antigo e parecia da época da Segunda Guerra. Estava cheio. Tiramos nossos casacos e os colocamos no cabide de entrada. Escolhemos uma mesa próxima ao salão onde havia três senhores tocando violino.

Pedimos dois cafés. Olhei para os grandes olhos de Cínthia e ela sorria. Olhou para mim e passou seu braço em volta do meu. Com um gesto, pedi a um dos violinistas que viesse até a mesa e tocasse para ela. Ele sorriu e veio. Ela me apertou forte.

- Que romântico! – sorriu.

E ali ficamos naquele enlevo, os dois, felizes, parecendo um casal de namorados.
Faltavam dois minutos para o trem partir. Paguei os cafés e corremos para o trem.

Nos acomodamos perto da janela. Quando o relógio da Gare Cornavin marcou onze e dois o trem começou a se movimentar.

Em casa, nos esperava Cecília, sua irmã, com seus quatro filhos. Antes de entrar no quarto, eu a abracei forte e tentei beijá-la. Ela me impediu delicadamente, dizendo:

- O nosso encontro está tão perfeito que tenho medo de estragar se nos beijarmos. Mudará tudo. Vamos ficar assim, querido, como namorados de alma. É melhor assim.
Eu iria logo embora, então sorri e a deixei ir.

Cecília era vice-côncul do consulado brasileiro em Genebra e Cínthia a secretária do consulado. Conheci Cecília por telefone, numa manhã dramática em que fui acordado com a notícia de que meu irmão mais velho tinha sido preso por comportamento suspeito. A verdade, é que ele voltara à Suíça para reatar com a ex-mulher e ela não o recebeu. Sem grana e sem pouso, forçou a porta de uma universidade para entrar e fugir do frio. Os seguranças o deteram e chamaram a polícia. Meu irmão estava psicologicamente perturbado e foi encaminhado a um hospital psiquiátrico do estado e seus documentos enviados ao consulado.

O consulado, na pessoa de Cecília Oliveira, prestou a mim e a minha família um serviço além de extraordinário, humano. Mas ela não parou por aí. Com a informação de que o médico só daria alta para meu irmão se alguém da família o acompanhasse, ficamos numa situação difícil. Então Cecília, movida por solidariedade, me convidou para se hospedar em sua casa durante a semana que eu passaria em Genebra. Fiquei emocionado com seu convite e aceitei. Ela estaria me aguardando no aeroporto segurando uma placa com meu nome.

Lá, não vi ninguém me esperando. Distraído, vi uma mulher se aproximar apressada. “Como é bonita”, pensei. Ao olhar para suas mãos vi meu nome numa placa. Fui ao seu encontro alegremente e a abracei, sorrindo. Constrangida, ela recuou um pouco e disse:

- Germano, eu não sou a Cecília. Sou a Cínthia, irmã dela.

Eu sorri e a abracei de novo.

- Tanto faz! – eu disse.

Ela riu da minha espontaneidade e disse que Cecília estava nos esperando.

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