segunda-feira, 12 de julho de 2010
Musicofobia
Acordei na última sexta-feira bastante animado. Estava contente, pois havia dormido relativamente bem durante a noite. Me sentia tranquilo. Tudo começava a transcorrer bem. Minha cirurgia estava marcada, os exames deram excelente e, da noite para o dia, ganhei uma enfermeira luxuosa que me dará todo apoio no pós-operatório, 24 horas por dia, durante os quinze dias de licença médica! Eu não merecia tanto, mas graça é favor imerecido mesmo. A paz sentimental também voltou. Após um período turbulento em que feridas foram abertas sem necessidade, senti que meu coração voltava ao que era antes e que, logo, estaria pronto a amar novamente.
Me sentia feliz. O dia no trabalho foi agradável e à noite fui bater meu ponto na Zug para encontrar os amigos. De lá, decidi fazer uma visita ao Mucuripe, um lugar que não pisava fazia dois anos. Pré-combinei com uma amiga e fiquei com ela e sua turma lá. Eu estava muito bem disposto aquele dia para ir somente para casa. Queria ver gente, ouvir música, dançar e celebrar a alegria de estar vivo e com saúde!
Entramos na Alfândega. Mr. Babão tocava Axé-music antigo, aquelas músicas bem do início do movimento baiano. Pintou uma nostalgia dos carnavais que passei com bons amigos em Aracati cinco anos seguidos. A boate estava ótima: gente bonita, alegre, ambiente iluminado, arejado. Gostei dali. Mas a turma que me fiz acompanhar era feita de peixinhos fora d’água naquele aquário colorido. Me puxaram para outra boate, lá era onde as coisas aconteciam, compreendi.
Atravessamos o corredor e uma porta se abriu. A boate estava lotada. Escuridão total rabiscada por luzes metálicas que desenhavam o ar. A música que tocava... Bem, não era uma música propriamente dita, era um baticum violento e repetitivo. De repente, uma voz tonitruante encheu o recinto: WELCOME TO HELL!... Não, não houve essa voz, mas se tivesse havido não tenho dúvidas que teria causado um urro de comoção na galera.
Ali, ninguém se vê. Fiquei dançando sem compromisso com minha amiga enquanto observava as sombras que se movimentavam ao redor. De repente, uma luz azul acendeu e gravou a pista na minha mente. Abri os braços: Horizonte!,suspirei.
O estilo de música é controverso. Algumas delas na linha tecno-dance, como Children, This Time, Stereo Love, Underneath são realmente ótimas, mas no geral o que rola mesmo é a repetição massacrante de algumas notas que fariam um torturador chinês lacrimejar de emoção pensando como faria sua vítima infeliz com aquela nova arma!
Estilo musical tem a ver com o tempo, as gerações e as novas tecnologias. Hoje ninguém dança mais música lenta nas boates. Isso é totalmente fora de moda e sem mais espaço em lugar algum do mundo das pistas. Aquele romantismo de chamar uma garota pra dançar foi substituído pelo olhar insinuante, a chegada nem tão de mansinho assim e, se não tiver muito o que dizer e os olhares dos dois estiverem de acordo, o beijo descompromissado (e a música truando!). Talvez fiquem juntos a noite inteira, talvez não.
E aqui vai um monte de questionamentos para você mesmo responder: Será que as músicas falam algo de sua época?
Se falarem, esse bate-estaca das raves, aquele zunido lisérgico das boates, o lazer meteórico das pistas e o arranjo sideral dessas músicas descreveriam um tempo frio e insensível?
Seria essa música uma motivação dos sentidos, mas sem passar pelo coração?
Daria para amar essas músicas de verdade, como gerações amaram e ainda amam os Beatles, Sinatra, Duran Duran, Michael Jackson, Keane e outras bandas e cantores que marcaram e estão marcando a história, ou são apenas músicas puramente descartáveis, salvo algumas exceções?
Uma música sem melodia apenas com decibéis killers- tímpanos pode ser gravada na memória de uma forma afetiva?
Como iniciar um romance verdadeiro ao som de uma pistola de raio lazer zumbindo no ouvido?
Ouvi dizer que há casos de epilepsias que podem ser despertados em ambientes claustrofóbicos como aqueles devido ao som estridente e ao estresse da luz estroboscópica.
Acho que fiquei uma hora na Burn. Embora não quisesse me afastar da minha amiga, senti um grande alívio ao sair dali. Fui ao banheiro. Na volta, fiz um rápido pit stop de volta na Alfândega. Que diferença! E, confesso, nunca fui fã de música baiana, mas a noite estava especial e ali, naquela pista iluminada, contrastando com a escuridão da outra boate, me pareceu o paraíso. Até as músicas baianas me pareceram pura poesia. Vê-se o que um purgatório não faz com a gente!
Mas minha amiga continuava lá e eu voltei. Perdi-a de vista, infelizmente. Me despedi por SMS e fui embora. Saí de lá às 3 da manhã. Levantei a viseira do capacete e deixei o vento frio da chuva refrescar meu rosto. Agradeci a Deus por aquele dia tão bom, e também pelo prazer de estar voltando para casa de moto com o barulhinho bom do motor atrás. Gostei do Mucuripe, daqui a dois anos eu volto de novo.
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Oi Germano! Acredito sim no poder da música em nossa alma...sinto que volto para qualquer lugar com certas músicas.Músicaaaaaaaaaas!!!Não gosto de música barulhenta...tenho de sentir a melodia.Abraços e uma ótima cirurgia!Silvana!
ResponderExcluirObrigado, querida! E viva a boa música!
ResponderExcluirGermano, acredito que a vida é feita de escolhas...existe lugares a se frequentar onde olhamos nos olhos das pessoas, ouvimos músicas que falam de sentimentos, de épocas que nos marcaram,nesses lugares sentimos calor humano...mas tbm existe os lugares frios,onde pessoas vão de forma egocêntrica..talvez para satisfazer uma necessidade qualquer...nesse tipo de ambiente o lema é: "proibido se envolver",o que prevalece é a quantidade..por isso enfatizo, que vc é quem escolhe o tipo de vida que quer levar! :)
ResponderExcluiràs x pra gente se desligar um pouco da realidade por alguns momentos ao som de tecno, é bom; tb é cultural. Para curtir nostalgias e algum romantismo, é incontestável músicas q soem mais sublimes do q uma batida forte pra chacoalhar o esqueleto...mas enfim, é o momento e é cultural...só não concordo, q qq tipo de balada ("frias" ou "quentes") se confundam com as orgias sociopatas ; de quem usa narcóticos, palavreado e comportamento baixos e sexo desenfreado, como se alguém fosse ali...tomar uma taça de vinho !
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