
Antes de 1986 a África do Sul, para mim, só tinha dois símbolos: o famigerado Apartheid e Nelson Mandela.
Mandela estava ainda na prisão amargando anos de confinamento, enquanto o regime do Apartheid blasfemava contra a humanidade discriminando os negros do país com uma filosofia nazistoide. O negros sul-africanos eram os judeus da época.
Eu, particularmente, detestava aquele país pelo seu governo. Até que Paul Simon, o grande parceiro de Art Garfunkel, compositores da famosa trilha do filme “A primeira noite de um homem”, com Dustin Hoffman, aterrissou na África do Sul. Lá, gravou um dos melhores discos de sua carreira, “Graceland”, com músicos e cantores locais, tendo como destaque o tema “You Can Call Me Al”.
Paul Simon é branco e optar em gravar com músicos e vocalistas negros era um ato político de protesto contra o Apartheid. Os arranjos vocais das músicas são de uma beleza tocante, revelando a alma viva e poética daquele povo sofrido, embora sufocada por um regime tirano. Comprei o disco imediatamente e o ouvi à exaustão. A agulha da vitrola passeou quilômetros pelos sucos do LP. Até hoje o tenho, é uma relíquia que guardo com carinho.
Depois de “Graceland”, nunca mais vi a África do Sul do mesmo jeito. E que idioma envolvente era aquele?, eu me perguntava. Africâner, inglês, sepédi, sessoto, setsuana são os idiomas oficiais. Tirando o inglês, não tenho a mínima ideia de qual destas línguas é cantada no álbum de Simon, mas tudo me leva a crer se tratar do idioma principal, o africâner.
Em 1990, Nelson Mandela saiu da prisão direto para a Presidência do país. De lá para cá, a questão racial foi sendo debelada e, graças a nobreza do líder Mandela, a África do Sul não teve o mesmo destino trágico de outras nações africanas que mergulharam num banho de sangue por causa de guerras étnicas. Mandela não tinha planos de vingança, mas de união nacional.
Agora, a Copa do Mundo da África de 2010 encanta o mundo novamente com a sua personalidade e a beleza linguística de seu idioma. Pelo menos, eu estou encantado. Ora, até esta Copa, me passou completamente batido que todas as bolas de cada Mundial tinham um nome, como a Tango da Espanha de 82. Seja como for, nenhuma outra
bola terá projeção igual a misteriosa Jabulani.
Jabulani? Que nome! E nem quer dizer bola, mas Celebração! A Copa da África tem um mascote, mas nem me lembro o nome, pois a mascote indiscutível deste Torneio é realmente a bola Jabulani. E a Vuvuzela? Nunca ninguém ouviu falar nesse nome no Brasil, aqui era corneta mesmo. Agora, alguém acredita que corneta vai continuar sendo chamada assim no Brasil sem um adendo “vuvuzela? Dificilmente.
A personagem desta Copa não é jogador algum, mas uma bola! Onde já se viu isso? Esse Mundial ou está muito sem graça (e a contar com os jogos do Brasil, está mesmo) ou o idioma da África do Sul é realmente um show à parte.
Na próxima Copa de 2014 no Brasil, não será de admirar que nas redondezas dos estádios não sejam encontrados pais com seus filhinhos e filhinhas de 4 anos vendendo bandeiras do Brasil. Quem sabe as meninas não venham a se chamar, a partir de agora em seus berços nas maternidades, de Jabulani Ferreira da Silva, Jabulani Maria Aparecida de Araújo, Jabulani Irineide de Souza...