quinta-feira, 20 de janeiro de 2011

Viagem ao Cariri – Impressões Parte 2



Foto: No Horto sob a Estátua do Pe. Ciço.


A figura legendária do Padre Cícero Romão Batista é mais que um objeto de culto em Juazeiro do Norte. Ela faz parte de uma cultura local. Empresas usam a imagem do “Padim” em suas instalações. É uma forma de identificação local.

Primeiro prefeito de Juazeiro do Norte e vice-governador do Ceará, Cicero Romão Batista tornou-se uma figura de relevo devido a uma série de controvérsias. Depois de um período em Roma, voltou a sua cidade natal, Crato, mas logo se mudou para Juazeiro, onde travou contato positivo com os habitantes da região. Pregava de casa em casa, visitava a comunidade e pôs freio aos costumes desregrados de bebedeira e prostituição. Logo se tornou querido. Mas seu sossego duraria pouco. Um dia, dando a comunhão para a beata Maria do Araújo, aconteceu o suposto milagre: a hóstia se transformou em sangue.

Com a presença de autoridades da igreja, o fato se repetiu outras vezes. Uma comissão comprovou o milagre, outra contestou. Cícero foi chamado a Fortaleza para se explicar. Segundo o biógrafo Daniel Walker, ele, no começo, não fez alarde do milagre, manteve-se cauteloso. Somente após suas repetições ele teria passado a defendê-lo abertamente.

Cícero foi excomungado pela Igreja e passou a celebrar missas em casa e abençoar o povo de sua janela. Mesmo fora oficialmente de suas funções eclesiásticas, continuou usando a batina e seguindo sua vida de padre. Para o povo comum, sua excomunhão nem existia. Por causa do milagre, sua fama cresceu e grandes romarias se deram início. Conta-se que ele quis acabar com ela, mas em vão.

Sem poder seguir nas "funções de ordem", entrou na política. Franco Rabelo, governador do Ceará na época, decidiu destruir o povoado de Juazeiro e o próprio padre. Auxiliado por Floro Bartolomeu, um médico baiano que depois se tornaria deputado, Padre Cícero e seu Juazeiro entraram em guerra. E venceram. E o governador foi deposto. Franco Rabelo enviara um canhão para frente de batalha e este foi capturado pelas tropas de Floro. Eu toquei neste canhão no Memorial Pe. Cícero.

Depois disso, Pe. Cícero se tornaria uma lenda. Há uma história muito conhecida de sua perspicácia. Um sertanejo pobre lhe pediu ajuda, pois não tinha mais como sustentar sua família. Cícero lhe disse para que ele fizesse lampiões, dezenas, centenas deles. O homem obedeceu. E pouco tempo depois, Cícero instituiu a festa de Nossa Senhora das Candeias. E quando o povo procurou lampião para comprar para as procissões, adivinha quem tinha para vender?

Hoje, ao pé da grande Estátua do Horto, vê-se diversas fitas mágicas e cabelos cortados na escadaria de promessas pagas. Ao lado, no Museu Vivo do Casarão Pe. Cícero, uma infinidade de pés, mãos, braços e cabeças esculpidas em madeira penduradas nas paredes por graças alcançadas.

É um caldeirão de fé e superstição. A Igreja oficial abandonou Pe. Cícero e nunca o reabilitou, mas, ainda hoje, esta mesma Igreja se vale dele em Juazeiro (talvez até de forma agradecida) para conter a “onda” evangélica que avança pelo sertão.

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